Sumário
O primeiro passo do tratamento de câncer de tireoide é feito através da cirurgia. Em casos selecionados e seguindo critérios técnicos, pode ser realizada tireoidectomia parcial, ou seja, apenas ser retirado um dos lobos (lados) da tireoide.
Nos casos em que ocorreu a retirada completa da glândula (tireoidectomia total) é possível realizar uma complementação com o tratamento com iodo radioativo, chamado de iodoterapia, também seguindo critérios específicos.
Propriedades do iodo
O iodo radioativo tem as mesmas propriedades químicas do iodo não radioativo, porém, por emitir radiações pode ser utilizado para aquisição de imagens e tratamentos médicos, através da especialidade conhecida como Medicina Nuclear. No caso da tireoide, como o tecido tireoideano utiliza iodo para a síntese hormonal, pode-se usar esta característica com a finalidade de tratar eventuais focos microscópicos de tecido tireoidiano remanescente.
Quando existem sinais de maior agressividade dos tumores de tireoide e, portanto, de recidiva após o tratamento inicial, pode-se utilizar doses de iodo radioativo para destruir pequenas células que tenham persistido no leito tireoideano. Esse mecanismo visa facilitar o acompanhamento pós-cirúrgico através de exames laboratoriais, pode ser usado para adjuvância (tratamento complementar pós-operatório) e até para destruir células tumorais que tenham migrado para outras partes do corpo (metástases à distância).
Preparação para o tratamento
Para realizar o tratamento com iodo radioativo (a conhecida Radioiodoterapia) é necessário um preparo do organismo.
Primeira parte
A primeira parte procura eliminar o excesso de iodo normal ao nosso corpo. Ela é realizada através de uma dieta de alimentos pobres em iodo, além de evitar-se uso de outras substâncias que podem conter iodo: medicamentos como a amiodarona, contraste iodado usado em exames radiológicos, uso de antissépticos iodados em procedimentos médicos ou odontológicos, além de cosméticos com corantes iodados.
Segunda parte
A segunda parte do preparo se faz por meio do aumento da produção do Hormônio Tireoestimulante (TSH), o que pode ser alcançado pela suspensão da reposição hormonal tireoidiana durante algum período específico ou utilizando-se um medicamento que estimula a produção de TSH, conhecido como tirotrofina alfa e com nome comercial de Thyrogen®. A iodoterapia é contraindicada em caso de gravidez pelo seu risco de criar mal-formações ao feto, no seu período intra-uterino.
A forma de administração do iodo radioativo é por via oral, por comprimidos ou em líquido. A depender da dose, o paciente pode ter que ficar internado durante algum período (1 ou 2 dias), para evitar que o mesmo dissipe radiação para o ambiente e outras pessoas. Em casos de administração de ate 50 mCi, a alta pode ocorrer no mesmo dia. Quando se administra doses maiores que essa (em geral, a administração pode alcançar até 150-200mCi), o paciente deve aguardar em um quarto apropriado (com proteção nas paredes e móveis, bem como isolamento quanto aos profissionais de saúde envolvidos no cuidado) até que o nível de radiação atingido seja o equivalente a 50 mCi.
Cuidados após o procedimento
Após a alta, são necessários cuidados de radioproteção para evitar que outras pessoas sejam expostas a radiação de forma desnecessária. A partir de então, o paciente deve evitar contato desnecessário, reduzindo o tempo e aumentado a distância quando o mesmo se faz necessário. Pede-se atenção e cuidados redobrados com pequenos animais, crianças e gestantes. Também são necessárias descargas adicionais após o uso do vaso sanitário, não preparar alimentos que sejam para o consumo de terceiros, utilizar utensílios de alimentação e lavagem de roupas em separado. Orienta-se não engravidar por pelo menos 6 meses após o iodo.
Como potenciais complicações, as mais comuns são danos a glândulas salivares e lacrimais que podem originar sintomas como boca seca, olho seco e redução do paladar para alguns alimentos. Com uso de doses maiores pode haver redução da função transitória de testículos e ovários, redução de glóbulos vermelhos/brancos e plaquetas também de forma transitória. Em casos extremos, com doses muito altas, pode ocorrer menopausa precoce e aumento da chance de desenvolver um segundo câncer, induzido pela radiação.
Desta forma é importante que a iodoterapia sempre seja indicada por um Médico Nuclear experiente, capaz de entender os riscos e benefícios para cada paciente e manter os cuidados e seguimento após o tratamento ter sido completado.
Texto escrito por
Dr. George B. Coura Filho
Médico nuclear ICESP
Coordenador médico DIMEN Vila Mariana
Vice presidente Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear
Orientador do programa de Oncologia da FMUSP